quinta-feira, fevereiro 01, 2007

Referendo

O assunto é sério e altamente debatido na actualidade deste jardim à beira-mar plantado. É certo que temos por hábito brincar (ou fazer pouco de, ou não encarar de forma séria) com tudo o que nos apeteça. Contudo, em princípio não brincaremos com este. Vamos até mais longe e pela primeira vez neste blog vamos tentar emitir opiniões sérias acerca de alguma coisa (não que as nossas opiniões interessem a alguém, mas resolvemos emiti-las na mesma).
Assim sendo, os autores do Pura Insanidade decidimos escrever um post sobre o que pensamos acerca da possível despenalização do aborto. Salvaguardamos desde já que é apenas a opinião de dois putos que julgam que sabem alguma coisa e que gostam de opinar um pouco sobre tudo. Ou seja, comente, mas não nos insulte em demasia (um ou dois impropérios devem bastar, obrigado), qualquer que seja a sua opinião.

Insano

Veredicto: A favor da despenalização da lei do aborto, com algumas salvaguardas.

É isso mesmo, sou da convicção que a lei do aborto deveria ser revista e/ou despenalizada (pormenores jurídicos é com o Mk). Porquê? Vou tentar ser conciso.
É um dado adquirido que todos cometemos erros na vida - uns mais, outros menos, uns maiores, outros menores - e que a maioria de nós tem de lidar com eles de maneira a aprendermos qualquer coisa mais. Também é verdade que na dita civilização ocidental a informação só não é apreendida por quem não quer e que existe toda uma panóplia de métodos anticontraceptivos. Desta forma, todos nós deveríamos proteger-nos antes e durante uma relação sexual, não só de forma a evitar futuros rebentos como também p'ra nos salvaguardarmos a nós próprios.
Tudo bem, esta é a racionalização dos factos que temos à nossa disposição. Contudo também todos sabemos que num momento em que o desejo seja praticamente incontrolável raramente a razão tem lugar a opinião e que na ausência de métodos anticontraceptivos grande parte da população não pára o que começou nem sei em busca dos ditos cujos. Isto não serve de desculpa, bem sei. Mas vamos supor o seguinte caso: fulano x conhece fulana y, há clara empatia entre os dois, troca de olhares, a líbido dispara. Os dois satisfazem o desejo que nutriam. Porém, era apenas isso, desejo, uma semana depois já não se suportam. E na primeira noite foi au naturelle, tal era o ímpeto. Se são dois seres completamente irresponsáveis? Sem dúvida!
Ainda assim há o risco de os dois contraírem doenças e de ela poder engravidar. Imaginemos mesmo que ela engravida. Imaginemos também que ela tem 18 anos e um futuro promissor na faculdade e ela é aluna de dezassetes na faculdade. Ah, e que os pais de ambos pertencem à classe média baixa deste maravilho país (todos sabemos o que isso significa, penso). Agora pergunto-me se vale a pena vir mais uma pessoa ao mundo destinada a sofrer? A não ter a atenção, conforto, condições e tratamento que todos os seres humanos no início das suas vidas merecem. Será que devemos acarretar este erro até ao fim das nossas vidas? Tornar a nossa vida e a de quem nos rodeia num inferno? Comprometer as carreiras de dois indivíduos de enorme potencial, que poderiam acrescentar algo mais à sociedade?
Resumindo, sou da opinião que cada caso é um caso e que o aborto deveria ser legalizado, ao mesmo tempo que seria criado um comité de avaliação dos casos, que funcionasse como nada funciona neste país: depressa e bem (aqui reside o complicado da matéria). E que só seria permitido a cada pessoa fazer no máximo um aborto. Com o sofrimento que o processo envolve, aprende-se uma lição de vida e em princípio não se volta a cometer o mesmo erro. Deveriam inclusive ser criadas políticas de incentivo a quem nunca abortou e/ou optou por ter a criança. Deveriam inclusive ser criadas gabinetes de apoio e aconselhamento, visto que quem passa por isso raramente está na posse da razão a 100%. Concordo também com o prazo das 10 semanas, na medida em que está provado cientificamente (os fanáticos que o comprovem e que investiguem) que ainda se trata de um feto e que o mesmo ainda não sofre.
Concordo ainda, e em parte, com o prof. Marcelo Rebelo de Sousa, na sua abordagem à liberalização do aborto (procurar no Google e YouTube por "Assim não"). Se se legalizar o aborto sem serem criadas regras, estou mesmo a ver o tuga a fazer aborto a torto e a direito. Ela: "olha, já não tomo a pílula há um mês e acabaram-se os preservativos cá em casa, tens alguns?". Ele: "Não, esqueci-me de comprar mais. Oh, mas anda lá querida, doenças sabemos que não temos (já fizemos os testes). Se acontecer alguma coisa aborta-se logo no início". Não me parece que seja algo improvável de suceder.
Bem sei que é uma abordagem bastante superficial nesta matéria e que o assunto dá pano para mangas, mas não espere demasiado de mim leitor, afinal de contas não passo de um pateta alegre com alguma opinião. Além disso é vez de dar "voz" ao Mk.


Mk

Veredicto: Também a favor da lei de despenalização do aborto, mas sem as restrições.

Este referendo surge, na minha opinião, em segundo plano como uma atribuição de responsabilidade aos portugueses, alias, às portuguesas. O que significa que fica a cargo do melhor discernimento de cada uma pesar os prós e contras da sua situação de vida e se esta implica mesmo a necessidade de abortar. Penso que o aborto deve ser visto, por mais mecânico e sem sentimentos que possa parecer, como um último recurso face aos azares da vida. O aborto nunca deve ser visto como uma medida de contracepção. Embora muitas criticas sejam feitas á mentalidade dos portugueses não me parece que o cenário do uso e abuso do aborto seja minimamente provável, embora possa acontecer. A excepção faz a regra. Daí que a limitação dos abortos a um por mulher me pareça uma restrição muito estranha. Imagine-se uma situação em que o tal azar acontece, o momento de loucura aliado à irresponsabilidade resulta em 9 meses de gestação. Face ás condições não favorável aborta-se e depois, mais tarde, a mulher é violada. Já não pode abortar... o que acontece nesses casos...
O mesmo sucede se o percentil minimalista da contracepção decide fazer das suas e falha mesmo. Já não pode ser feita a crítica da responsabilidade, ou da falta da mesma, neste caso é mesmo o azar que se impõe.
A questão não pode ser vista dessa forma pelo que já disse o cenário do aborto repetido não é uma realidade. Sem mais argumentos, basta pensar que o aborto por mais seguro e estudado (medicamente falando) que esteja, não deixa de ser uma operação, um procedimento cirúrgico que presumo não ser nada agradável para a mulher. É tão mais fácil comprar o preservativo ou tomar a pílula.
Passando agora à posição político-júridica da questão; o Sim defende mais que tudo a democracia. Senão reparem, a proibição do aborto torna a prática do mesmo vedada a qualquer que o queira fazer (exceptuando os casos já consagrados na lei), no entanto a legalização do mesmo não obriga ninguém a abortar. A despenalização do aborto não é uma imposição, como é retratada por alguns grupos obviamente defensores do Não, é antes uma escolha. Os argumentos que passam na televisão com senhoras a gritar para as câmaras “Eu era incapaz de abortar”, “Antes morrer que fazer um aborto”, não deixam de me surpreender e fazem-me questionar se realmente elas percebem o que está em jogo. Se elas não querem abortar, não o façam, ninguém as obriga, o que é ainda melhor, mais dinheiro se poupa.
Em relação a questão de estarmos perante uma vida ou se ainda não é nada e quando é que começa a ser, não me vou pronunciar, porque já está mais que debatido e é um daqueles pontos que passa sempre por uma apreciação pessoal de cada pessoa. Contudo acho que deve ser imposto o mínimo de humanidade nesta liberalização e devem ser estabelecidos prazos; o insano diz que são as 10 semanas, confio.
O argumento, único mesmo, que me deixa sem resposta é o de cariz económico; e este aplica-se especialmente ao caso português. As operações estão atrasadas não sei quantos meses, não há condições, não há médicos, quem vai fazer os abortos e onde? O que vai acontecer aos outros doentes, visto o aborto ser um procedimento com muita urgência? São de facto questões com as quais me vejo a braços e questões que ainda não vi serem respondidas por ninguém. O governo pegou no caso da pior maneira possível ao dizer que se a lei for aprovada existe uma verba já prevista para a construção de estabelecimentos próprios à prática do aborto e para o pagamento de tudo o que isso implica, médicos, enfermeiras e tudo mais. Obvio que a critica não tardou e voltamos ao mesmo, porque é que essa verba não é utilizada para, por exemplo, desenvolver as maternidades que não param de encerrar por falta de condições.
Dou mesmo o braço a torcer e aceito esta crítica. No entanto em vista de uma bem maior, uma necessidade é preciso que se façam alguns sacrifícios, é esta a minha posição, considero a despenalização do aborto uma coisa fundamental. Sei que não é a maneira mais correcta de ver a questão mas é a única possível, ou a que faz mais sentido face ao cenário que nos é apresentado.
Em vista sociológica subscrevo o que o insano disse. Porque razão deve uma mãe ser obrigada a acolher uma criança quando não sente por ela qualquer tipo de sentimento, especialmente aqueles de conotação positiva, carinho, amor; quando não tem quaisquer condições económicas para lhe proporcionar qualquer tipo de futuro? Não faz qualquer sentido. Nem é uma questão do que ela, como mãe e como jovem possa perder da vida (sem dúvida importante, a questão vai mais além), estou a falar do ponto de vista da criança. O que é que ela vem fazer ao mundo, ser mal tratada, passar fome, crescer num ambiente igual ao da sua família cujos exemplos vão resultar numa gravidez própria aos 16 anos. Torna-se um círculo vicioso que tem uma solução bastante simples. Sobre esta perspectiva aconselho a leitura do livro “freakonomics”.
Vou ouvindo em contraposição o argumento que se não querem ou não têm condições de criar os filhos, os devem deixar nas instituições sociais para que possam ser adoptados. Especialmente porque a adopção funciona de forma eficientíssima no nosso país; a celeridade do processo é nula, muitas famílias de adopção não são bem o que parecem, se as crianças tiverem o azar de não serem escolhidas pelas famílias de adopção tem o risonho futuro de pertencerem a instituições, como por exemplo a “Casa Pia”. Julgo não ser necessário desenvolver este último ponto.
Até aqui parece ser a opinião generalizada das pessoas, pelo menos daquelas a favor da despenalização do aborto. Eu gosto de, provavelmente exagerar, e ver a questão também do ponto de vista do homem. Ele não tem qualquer voto na matéria. Se por acaso a mulher, entenda-se namorada, na maioria dos casos, engravidar e ele quiser o filho e ela não, temos pena mas o aborto mantém-se. O mesmo já não sucede ao contrário. Se a mulher quer o filho e o homem não, temos pena mas tens que assumir as tuas responsabilidades e pagar as pensões devidas.
Estou em plena consciência que o corpo é da mulher e que portanto até, do ponto de vista jurídico, é impossível que se obrigue a mesma a prosseguir uma gravidez contra a sua vontade, vai contra o principio do livre desenvolvimento pessoal. Ainda assim a questão não deixa de me fazer confusão, porque me parece deveras injusta. Não tenho porém qualquer solução que se mostre minimamente aceitável. È mais um desabafo que outra coisa.


Ps: Aos partidários do Não, dou uma pequena alegria, um voto a menos a favor da despenalização do aborto, o meu, devido a burocracias e complicações ligadas ao recenseamento.
São estas as nossas opiniões sobre o assunto, tendo já o insano feito a ressalva, feitas de um ponto de vista puramente social (conversa de café) sem quaisquer recursos técnicos ou científicos. Não esperamos compreensão absoluta, nem sequer somos ingénuos ao ponto de acreditar que vamos mudar a ideologia de alguém, apenas decidimos fazer uma tomada de posição e possivelmente incitar a discussão.

3 comentários:

Anónimo disse...

Caro amigo, congratulo-me por partilharmos a mesma opinião. O problema nao se coloca sp em caso de irresponsabilidade, nao existem métodos anticontraceptivos infalíveis, sendo o mais eficaz a pílula com 99 % de eficácia, se tomada correctamente, o que nem sempre acontece, porque as mulheres se esquecem, ou se atrasam umas horas, nada de muito importante, mas que pode significar uma gravidez indesejada. quanto ao limite de um aborto não me parece correcto porque para a maioria das mulheres abortar nao é uma decisão tomada de animo leve, é muito provavelmente uma das mais difíceis ao longo da vida e as que as tomam sem remorsos ou dúvidas não são as pessoas que eu quero a ser mães e pais. acima de tudo eu confio nas mulheres e não me parece que vá haver muita gente a usar o aborto como método anticontraceptivo. quem quer mesmo fazer um aborto vai fazê-lo, a diferença é as condicções em que o mesmo é feito. desculpa tão longo comentário, mas nao é um assunto qualquer.
abraço

Mk disse...

Semi contente. Vou ver se começo a andar com um daqules "pins" verdes que dizem "SIM", so mesmo para provocar sentimentos de odio e raiva para com a minha pessoa.
Agora a serio, vamos la ver se é desta que o Socrates cumpre com o prometido.

Anónimo disse...

axo k fazes bem... eu tb so fico contente dps de ver tomadas tds as medidas necessárias... que desconfiança é essa? a ele se deve o referendo, portanto é obvio k vai cumprir